
O PCP, demorou 50 anos a perceber que o povo português pouco tinha de operário e ainda menos de revolucionário. Durante 50 anos conspirou contra o fascismo, mas pouco mais lhe fez que meras cócegas. Foi o primeiro inclusive a ajudar a propria PIDE na caça aos esquerdalhos, que no dealbar da ditadura, já se atreviam a por umas bombitas aqui e acolá. O Dr. Álvaro Cunhal que não admitia ingerências na oposição ao regime, nem abdicava da liderança do partido que, em causa própria, julgava ser o único com legitimidade moral para a protagonizar.
Assim, quando o movimento dos capitães resolveu tratar do “Estado a que isto chegou” (como o disse Salgueiro Maia na madrugada de 25/04/74), o PCP talvez perdido entre Moscovo, Paris e Bucareste, já havia perdido o comboio da história de Portugal. Foi tanto assim, que o próprio Álvaro Cunhal, só chegou a Santa Apolónia pela certa, vários dias após a revolução dos cravos ter triunfado.
O PCP tinha avaliado mal o povo português no tempo da resistência anti-fascista e acabou por ver um punhado de capitães fazer o que ele manifestamente sempre propalou mas nunca sequer verdadeiramente tentou, derrubar o Estado Novo!
Finda a ditadura, deposto o regime, só havia um partido verdadeiramente organizado e instalado no País. Metodicamente o PCP saía da clandestinidade e tomava as rédeas soltas de uma festa que convinha ser dirigida a preceito da vontade do internacionalismo soviético.
Com o 25 de Abril o PCP tinha aprendido que o povo português era sereno, e que mais depressa saia à rua com uma flor na lapela, do que com uma foice e um martelo nas mãos. Apesar do Gonçalvismo e dos aventureirismos sociais-fascistas do PREC, por conta do desenlace do 25 de Novembro, os comunistas lá aceitaram ir a votos à moda da democracia burguesas ocidentais. Resultado, o povo soberano nem sequer lhe confiou 20%, o velho partido da resistência anti-fascista via ex-deputados da defunta Assembleia Nacional granjearem mais simpatia popular do que os seus dirigentes ex-tarrafalistas.
O PCP tinha avaliado mal o povo português no tempo do processo revolucionário em curso e acabou como terceira força politica do novo espectro eleitoral. Para mais, desbaratou o apoio dos militares que ainda tinha com arma de manga no dia 25/11/75.
Mais tarde, o país quis modernizar-se, abrir as portas à Europa, corrigir os sérios prejuízos que a nacionalização a metro do tecido produtivo nacional tinha trazido para a eficiência da nossa economia. O PCP, foi sempre contra todos os passos que nos tornaram naquilo que nunca deveríamos ter deixado de ser: um país europeu!
“A cortina de ferro” caiu, e o PCP escolheu criticar aqueles que derrubaram o “muro da vergonha”. O “centralismo democrático” imposto a gosto dos fiéis estalinistas leninistas prevaleceu dentro do próprio partido, e este, pouco a pouco, sangrou para as forças democráticas de esquerda, os seus melhores pensadores e activistas.
O PCP tinha avaliado mal a história do séc. XX e tinha ficado isolado na esquerda europeia.
O PCP tinha avaliado mal os seus próprios quadros, e negando as evidencias colocou homens de bem de mal com a sua consciência cívica e politica.
Por fim o PCP, julgou saber interpretar melhor que quaisquer outros a natureza do povo português, e por força do aparente sucesso na escolha de um Secretário Geral que claramente empatiza como as franjas menos alfabetizadas do eleitorado, foi-se mantendo à tona do seu limiar de persistência, nos elogios à tomada do Palácio de Inverno em 1917.
Assim chegamos aos dias de hoje e á actual crise do sistema capitalista. Crê agora, o PCP, que estão criadas as condições suficientes para a agitação social (que a seu tempo não deixará de ajudar a acicatar) para ter o poder que as urnas sempre negaram aos comunistas.
O PCP avalia mal o capitalismo, pois daqui a 3 anos (no pior dos cenários) este ressurgirá como um sistema mais limpo, ainda mais produtivo, ainda mais eficiente. Logo, um capitalismo mais querido pelas pessoas.
Mas será este o pecado de avaliação do PCP?
Talvez no caso presente o PCP esteja por fim avaliar bem a situação. Se calhar talvez saiba que esta crise não vai durar para sempre. Para os fins e propósitos da instauração de uma sociedade comunista, há que aproveitar o momento e ajudar a criar todas as situações possíveis de destabilização da paz social, um factor, que o PCP sabe ser crítico para a recuperação geral do sistema.
Neste contexto, compreendesse o cavalgar da onda de violência que se abateu sobre Vital Moreira. O PCP não pode trair os camaradas que chamaram traidor ao homem que é socialista de sempre mas que atempadamente escolheu enveredar pela via democrática para fazer valer os seus ideais. Pelo contrário, o PCP julga que aquela horda de analfabetos cívicos, que mancharam de vergonha o dia do trabalhador, é representante de um Portugal oprimido que com o devido incentivo e direcção puderam um dia dar ao PCP a revolução que o PCP nunca foi capaz de fazer.
O pecado original do Partido Comunista Português é que de “português” sempre teve muito pouco. O PC não compreende o povo que pretende dirigir. O “Homem Novo” soviético, nunca existiu nem existirá num povo de brandos costumes e mais brandas convicções. Num país que tem Verão de Maio a Outubro, tem bom peixe, bom vinho e bom sol, não há muito tempo para ler o “Das Kapital”.
O PCP de hoje continua a reinterpretar a cartilha de Álvaro Cunhal, o homem curtido pela solitária de Peniche, sovietizado pelo exílio, e moldou um partido à imagem da sua desconfiança no ser humano.
O PCP é um partido que se diz virginal, sem pecados, num país em que toda a gente sabe que toda a gente peca.
O PCP é um partido escuro, como as caves da clandestinidade que na prática nunca abandonou na totalidade. Portugal, pode até já não ser o Portugal da aldeia da roupa branca, mas já é muito mais o País das “festas de branco” das noites estivais algarvias, do que da o da festivaleira quermesse do Avante.
O PCP não é na verdade abreviatura para Partido Comunista Português, é o antes para Pacto Clandestino Passadista. O PCP, são ainda muitos homens e mulheres (felizmente cada vez menos) organizados num delirante colectivo de dor e ódio, que bondosamente conspiram contra tudo aquilo que os seus concidadãos teimosamente não desistem de preservar.