segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Separar as águas.

Se Moisés fosse candidato às próximas eleições presidenciais em Portugal, ganhava de certeza. A confusão é tanta, tamanha é a quantidade e a variedade de fontes e de pseudo informações e informadores que parecem jorrar debaixo de cada calhau, que o que do que precisávamos mesmo, não era de outro jornal de sexta, mas sim de um Moisés que abrisse caminho pelas águas tortuosas da desinformação a caminho da terra prometida da confiança.

Quando os homens não estão à altura dos momentos, devemos procurar refúgio nas nossas reservas éticas morais e legais. A nossa primeira reserva colectiva seria porventura a que esta personificada na figura maior do nosso Estado, mas nem esse cidadão está a salvo do presente lamaçal, e até é suspeito de ser um dos principais chafurdadores.

Resta-nos a Lei, resta-nos o Estado de Direito, resta-nos acreditar no princípio da separação de poderes e na fiscalização e auto-regulação de forças que estes exercem entre si:

  • Podemos acreditar que o que temos funciona, que a Lei prevalece, que a Lei é a expressão máxima da nossa vontade democraticamente demonstrada.
  • Podemos não acreditar em mais nada, podemos desconfiar das instituições, pôr em causa os seus fundamentos e desrespeitar os códigos sociais, desrespeitar as leis, quem as produz e aplica.

Neste momento, a escolha mais simples para os portugueses é assumirem a sua boa fé ou má fé naquilo que entendemos por República Portuguesa, pela nossa democracia, pelos nossos tribunais.

Aqueles que respondam negativamente, aqueles que para a resolução de um diferendo ou de um problema social acham mais legitimo e eficaz recorrer-se à difamação num qualquer pasquim do que aos tribunais ou a qualquer outro instituto público, então que tomem bem consciência do caminho que começam a trilhar.

O nosso Primeiro-Ministro pode não ser a pessoa mais simpática aos olhos de muitos portugueses e alguns deles naturalmente votarão contra ele no próximo dia 27, mas sustentar essa decisão não na avaliação critica da eficácia das suas políticas, mas sim no achincalhamento não apenas de José Sócrates mas já de todos os princípios e valores que sustentam a nossa democracia?

Agora, até o processo Casa Pia serve para a campanha política contra a credibilidade das nossas instituições. Quem ataca o conselho superior de magistratura a pensar que ataca o PS saiba que ataca antes de mais os juízes em quem temos de confiar para bem da nossa sociedade. Da mesma forma, quem defende a “Casa Civil da Presidência da Republica”, com o argumento de que em Portugal é mais fiável e eficaz ao Presidente da República recorrer a denuncias semi-anónimas e veladas a meios de media seleccionados, ao invés de recorrer às instituições do Estado como a Procuradoria Geral da República ou a Policia Judiciária, está a pôr tudo em causa.

O que é preocupante, é verificarmos que quem joga o jogo democrático não hesita em fazer batota quando em desvantagem. O PSD recorre à mesma imunda estratégia do fascismo em que a desinformação e a calúnia sobre “os do reviralho” conseguia a lealdade de cidadãos que de boa fé neles acreditavam. Tivemos 50 anos parados no tempo, com um regime sustentado nos bufos e nos invejosos que conspurcavam a honra e dignidade de muitos dos nossos melhores apenas e só porque eram “perigosos democratas”.

O destacado líder do PSD, Fernando Ruas sob o beneplácito de Manuela Ferreira Leite soube separar bem as águas quando evocou uma quadra em que julgava em desuso: “Um cravo na lapela fica sempre bem, principalmente a certos filhos da mãe”.

É aceitável que o carácter de uma pessoa possa ser colocado em causa pelas suas opções políticas com tamanha leviandade?

Portugal não pode ser uma imensa Vise, eu não aceito ser alcunhado “filho da mãe” por usar um cravo na lapela, da mesma forma como não quereria ser “uma ratazana” por usar uma cruz de David na Alemanha de Hitler.

Este é o tempo de separar as águas, esta lama que vem sempre do mesmo lado e na mesma direcção só pode aproveitar a quem desrespeita por completos os valores da nossa democracia.

Nestas eleições, mais do que escolhermos entre a esquerda e a direita temos mesmo que fazer uma outra opção bem mais grave e consequente, ou defendemos o Estado de Direito que tanto custou a ganhar e construir ou alinhamos com aqueles para quem o Estado de Direito e as suas instituições com poderes autónomos e equilibrados são uma imensa “força de bloqueio”.

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